quarta-feira, 22 de maio de 2013

Espiritismo, do que se trata mesmo?






Vinícius Lousada[1]



Então, o que é o Espiritismo?

                Oportunamente, o professor Herculano Pires teve o ensejo de afirmar: “O Espiritismo, nascido ontem, nos meados do século passado, é hoje o Grande Desconhecido dos que o aprovam e o louvam e dos que o atacam e criticam.”[2] Essa afirmativa acaba por nos fazer entender que essa jovem filosofia espiritualista ainda é ignorada, seja por parte de seus adeptos seja pelos seus detratores.
Ao tempo de Kardec, como ainda hoje, aqueles que nada sabem do Espiritismo tendem a tomá-lo pelo que ele não é: mais uma religião ou seita, com seus mistérios, supostos sacerdotes dedicados a consultar na penumbra os mortos para os fins mais variados, conforme a prodigalidade da imaginação do crítico, por sua vez, incapaz de ser levado a sério até mesmo pelo mais caridoso adepto do Espiritismo, em função da falta de compromisso da crítica infundada com a verdade. Opinar sobre o que se desconhece revela a leviandade do opinante.
Por outro lado, a afirmação de Herculano está a nos dizer que os espíritas necessitam conhecer bem o Espiritismo, estudando a fundo a doutrina kardequiana para assim edificar na alma a convicção dos princípios filosóficos que dizem adotar, aproveitando-os para o seu progresso espiritual.
                Mas, para atender a questão proposta no título desse texto é importante considerar as anotações de Allan Kardec no sentido de formular uma conceituação da Doutrina dos Espíritos: diz o mestre: “O Espiritismo é, ao mesmo tempo, uma ciência de observação e uma doutrina filosófica. Como ciência prática, consiste nas relações que se podem estabelecer com os Espíritos; como filosofia, compreende todas as consequências morais decorrentes dessas relações.”[3]
Aliás, em O Livro dos Espíritos, ele define o Espiritismo numa tríade. Diz ele: “O Espiritismo se apresenta sob três aspectos diferentes: o das manifestações, o dos princípios e da filosofia que delas decorrem e o da aplicação desses princípios.”[4] O aspecto das manifestações consiste no ângulo experimental ou científico onde estas são objeto de observação, e está relacionado ao paradigma das ciências positivas do século XIX, embora Kardec não se confine nele ao estruturar as bases de uma ciência delineada na colaboração interexistencial[5], cujo método e consequências filosóficas nascem na parceria estabelecida por ele com médiuns e Espíritos na pesquisa perseverante das comunicações espontâneas ou daquelas obtidas mediante a evocação de Espíritos.
Vejamos que o conceito apontado assinala o Espiritismo como uma ciência filosófica com consequências morais e, como nos escritos de Allan Kardec nenhuma palavra é vã, hábito do educador Rivail que procurava ter exatidão no que escrevia para bem comunicar suas ideias, procuremos estudar aqui as categorias de pensamento “ciência”, “filosofia” e “moral” para construirmos um entendimento sobre a natureza do Espiritismo, tendo em vista a pergunta geradora dessa reflexão.
Para tanto, tomo a liberdade de recorrer a um dicionário de filosofia que considero didático e cuja familiaridade com o mesmo nasce do cotidiano do meu ofício de professor. Trata-se do Dicionário Básico de Filosofia[6]
               


Ciência Espírita

Ali encontramos um conceito mais clássico e outro que pode ser considerado moderno sobre o verbete ciência. Os autores do dicionário consideram ciência como um conjunto de conhecimentos adquiridos metodicamente, sistematizados e capazes de serem transpostos didaticamente para o ensino, tendo em vista sua apropriação e difusão. Ciência pode ser concebida como uma modalidade de saber formada por uma gama de aquisições intelectuais que pretende dar uma explicação racional e objetiva da realidade, ou de algum fenômeno. E eu acrescentaria: através do controle, experimentação e universalização de resultados.
Vale lembrar, como diz Edgar Morin, que “As teorias científicas surgem dos espíritos humanos no seio de uma cultura hic et nunc.”[7] Desse modo, a parte experimental do Espiritismo, em sua fundação, está mergulhada em um contexto que lhe matiza com as tintas da racionalidade científica daquela época, que era de viés positivista, nada obstante, Kardec extrapole de forma produtiva os limites impostos pelo paradigma científico então dominante.
                O Espiritismo, sendo ciência de observação, tem por objeto de investigação as relações dos Espíritos com o mundo corpóreo, como asseverou outrora Kardec na obra O que é o Espiritismo. Sua metodologia de pesquisa está bem descrita por ele em O Livro dos Médiuns, de onde se depreende um modo seguro de lidar com os Espíritos em reuniões sérias. Através dessa metodologia foi tirado o véu que encobria parte da percepção do mundo invisível e fez-nos entrever a imortalidade da alma atestada pelos fatos que a mediunidade apresenta.
Pelos registros presentes em a Revista Espírita, publicada por Kardec de 1858 a 1869, compreende-se que nas reuniões da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, fundada pelo mestre em 1858, o diálogo com os Espíritos tinha finalidade educativa bem clara, sendo a mesma um princípio orientador da metodologia empregada. O mestre, ao dirigir os trabalhos mediúnicos, evocava Espíritos Superiores para questioná-los sobre temas filosóficos de grande profundidade, através dos médiuns que atuavam na Sociedade. Doutras vezes as comunicações se apresentavam de forma espontânea. Até mesmo com os Espíritos sofredores, ao colaborar com a educação deles pela palavra fraternal e esclarecedora, Kardec pinçava saberes úteis para a caminhada do ser humano no mundo, tendo em vista a evolução espiritual de encarnados e desencarnados.
Jamais tomou qualquer Espírito como revelador privilegiado e nem as teses deles como verdades absolutas. Fazia comparação dos ensinamentos, tanto aqueles colhidos nas reuniões em Paris como os oriundos de correspondência com outros grupos, recebidos através de médiuns desconhecidos daqueles primeiros. Outras vezes o ensino espontâneo em diversos grupos de localidades distintas convergia para a sociedade de Paris e, em todos os casos, o mestre empreendia o exame racional e a comparação das comunicações, extraindo desse modo, no elemento comum, um postulado filosófico do Espiritismo ou um ensinamento digno de se dizer espírita, por não se tratar de um sistema de ideias particular de um Espírito ou de um só médium. Kardec chamou esse meio de verificação de controle universal do ensino dos Espíritos[8].
                Outro elemento interessante da Ciência Espírita decorre do fato de ela ser apresentada como progressista, na base kardequiana, e dialógica em relação às ciências ordinárias. Nesse sentido apontou o insigne mestre: “O Espiritismo, marchando com o progresso, jamais será ultrapassado porque, se novas descobertas demonstrassem estar em erro sobre um certo ponto, ele se modificaria sobre esse ponto; se uma nova verdade se revelar, ele a aceitará.”[9]

 Edgar Morin


Filosofia Espírita

Para tornar inteligível o aspecto filosófico do Espiritismo parece ser conveniente conceituar filosofia, muito embora, essa também não seja tarefa simples. É possível ver a filosofia como exercício de busca ou “amor da sabedoria” (Pitágoras). Dessa forma, no dicionário já referido, encontramos a filosofia retratada como uma busca pela apropriação dos princípios em que se estriba um saber. Na tradição filosófica, ao longo de sua História, a filosofia chegou a ser entendida como a totalidade do saber.
Na Idade média foi posta como serva da Teologia que procurava dar-lhe fundamento sem que a atividade filosófica devesse questioná-la. Já na modernidade a filosofia aparece como a aventura da emancipação do pensamento religioso, estabelecendo-se como investigação dos “primeiros princípios”, e assim contribuindo com a ciência em seus fundamentos, consequências e com a análise das razões da ação humana. Contemporaneamente, a filosofia propõe a dúvida, o ceticismo saudável, e o pensamento crítico em torno do ser humano, do mundo, do próprio saber...
A Filosofia Espírita surge com a publicação de O Livro dos Espíritos, de onde se depreendem os princípios e os desdobramentos filosóficos, depois desenvolvidos nas demais obras fundamentais[10] trazidas a lume. É uma filosofia que ensina o autoconhecimento como instrumento indispensável à evolução intelecto-moral do Espírito e “Sendo o Espiritismo uma nova visão do homem e do mundo, caracteriza-se como um pensar filosófico, como uma filosofia estruturada na pesquisa do conhecimento, do ser e do universo. Tendo base experimental, seu filosofar é existencial, atua no mundo para modificá-lo.”[11] E, acrescentaríamos, tem um profundo potencial para transformar o mundo a partir do indivíduo. “Sua força está na sua filosofia, no apelo que dirige à razão, ao bom-senso.”[12]
Logo, o aspecto filosófico retrata os princípios e ensinamentos dos Espíritos Superiores recolhidos e organizados por Allan Kardec, somados ao seu contributo nas reflexões e desdobramentos que propõe às lições dos imortais nas obras fundamentais da Doutrina. O Espiritismo desencadeia, a partir da apreciação que podemos ter dos princípios que exara, uma moral que conduz o adepto à ética do amor lecionada por Jesus. Essa moral não está enclausurada nas teologias do cristianismo dos homens, mas está viva na espiritualidade subjacente ao Cristianismo do Cristo, presente no conteúdo da Filosofia Espírita.

Prof. Herculano Pires



Moral Espírita

                A palavra moral se refere aos costumes de uma sociedade ou cultura, em um sentido restrito. Já, em um significado mais amplo, como assinala o Dicionário Básico de Filosofia, pode ser vista como sinônimo de ética, como teoria dos valores que regulam a conduta humana, de forma normativa ou prescritiva. Pode ser distinguida em uma moral do bem e do dever, ou seja, o que define o que é o bem para o ser humano e o que ele deve fazer.
                Em O Livro dos Espíritos, encontramos uma conceituação de moral que está na sintonia do que se verifica na explicitação do termo acima, da moral como ética que nos aponta o sentido do bem e como realizá-lo. Dizem os Espíritos interlocutores de Kardec: “A moral é a regra de bem proceder, isto é, de distinguir o bem do mal. Funda-se na observância da lei de Deus. O homem procede bem quando tudo faz pelo bem de todos, porque então cumpre a lei de Deus.”[13] Vejamos que essa definição estabelece a moral na prática do bem, na vivência da razoabilidade ética que diferencia o bem do mal, fundamentada nas Leis Divinas, cujo parâmetro do que se deve fazer está na consideração do que é o bem da coletividade.
                Cabe ao indivíduo, no areópago da própria consciência, fazer uso da inteligência para diferenciar o que é bem e o que é mal[14]. Um recurso disponível para evitar possíveis enganos nessa diferenciação no plano das relações humanas está na aplicação do que Kardec chamou de lei da solidariedade ou reciprocidade[15]. Aliás, o mestre afirmou em um momento: “A moral dos Espíritos superiores se resume, como a do Cristo, nesta máxima evangélica: Fazer aos outros o que desejamos que os outros nos façam", ou seja, fazer o bem e não o mal. O homem encontra nesse princípio a regra universal de conduta, mesmo para as menores ações.”[16]
                Todavia, no procedimento para consigo mesmo, onde essa máxima não teria alcance, o parâmetro para o bem é o limite da necessidade que a Lei Natural impõe. Quando é ultrapassado esse limite o autor da ação lhe sofre as consequências, como simples resultado da ausência de contenção. O sofrimento causado pela ausência de limites é de acordo com a ação empreendida, cabendo a cada um preveni-lo na conduta moderada em tudo. Já disse a sabedoria ancestral: nada em excesso!
                Encontramos proposições para a aplicação da moral espírita na análise que Allan Kardec faz da conduta da pessoa de bem, apresentando didaticamente a ética que decorre dos ensinamentos espíritas. Vale a pena meditar sobre esse texto e perceber os caminhos possíveis de uma conduta equilibrada e sábia que o mestre sintetiza nessa frase: “O verdadeiro homem de bem é o que cumpre a lei de justiça, de amor e de caridade, na sua maior pureza.”[17]
                Para bem avaliarmos o quanto essa ética orienta a nossa conduta, consideremos que o conhecimento de si mesmo é saber fundamental, verdadeira “chave do progresso individual”[18]. Praticar a ética do homem de bem, que é a ética de Jesus, e analisar-se em vista do aprimoramento pessoal são ações que, juntas, formam indubitavelmente um excepcional roteiro para quem deseja entender o Espiritismo em profundidade e dar atenção ao objetivo essencial de sua proposta filosófica que é tornar melhor o ser humano.





[1] Educador e pesquisador.
[2] PIRES, Herculano. Curso dinâmico de Espiritismo: o grande desconhecido. São Paulo: Paideia, 1979, p. 11.
[3] KARDEC, Allan. O Espiritismo em sua expressão mais simples e outros opúsculos de Kardec. Tradução Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2007, p. 63.
[4] O Livro dos Espíritos. Conclusão, item VII.
[5] PIRES, Herculano. Curso dinâmico de Espiritismo: o grande desconhecido. São Paulo: Paideia, 1979, p. 58.
[6] JAPIASSÚ, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário básico de filosofia. 4. Ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006.
[7] MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 13. Ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010, p. 25.
[8] O Evangelho segundo o Espiritismo, Introdução, item II.
[9] A Gênese: os milagres e as previsões segundo o espiritismo. Cap. I, item 55.
[10] Caso o leitor queira saber mais sobre as obras fundamentais do Espiritismo, convido-o a ler o artigo de nossa autoria intitulado “Por que ler Kardec?”, acessível em http://saberesdoespirito.blogspot.com.br/2009/06/por-que-ler-kardec.html.
[11] RÉGIS, Jaci.  Kardec foi um filósofo?. In: A Reencarnação. n º 401 - Ano L. Porto Alegre: FERGS, 1984.
[12] O Livro dos Espíritos, Conclusão, item VI.
[13] O Livro dos Espíritos, questão 629.
[14] O Livro dos Espíritos, questão 631.
[15] O Livro dos Espíritos, questão 633.
[16] O Livro dos Espíritos, Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita, item VI.
[17] O Evangelho segundo o espiritismo, cap. XVII, item 3.
[18] O Livro dos Espíritos, questão 919-a.

sexta-feira, 17 de maio de 2013

FAMÍLIA E VIDA CONJUGAL FELIZ


Namoro em Ipanema, a photo by Vinícius Lousada on Flickr.


Larissa Camacho Carvalho[1]
Vinícius Lima Lousada[2]

A construção social da família

            Ao longo dos anos em que a humanidade aperfeiçoou-se, no processo de evolução ditado pela Lei Divina do Progresso, a constituição da família foi umas das mais significativas instituições formadas pelos homens. Inicialmente, quando mulheres e homens da era paleolítica agrupavam-se em bandos garantindo sua defesa pessoal e, respeitando a Lei de Preservação, multiplicavam-se através da procriação, pouco raciocinavam sobre suas ligações com os indivíduos do grupo. A união era útil, respeitava as Leis Divinas, o instinto de sobrevivência, sem, no entanto, centrar-se nos sentimentos elevados da abnegação, da fraternidade, da caridade, do amor ao próximo.
            O desenvolvimento da inteligência no homem, aliado ao das instituições por ele formadas criaram a necessidade de instituírem-se laços diferenciados entre os indivíduos e as uniões responsáveis pela procriação ganharam um estatuto distinto. Este estatuto não foi somente direcionado para o casal que procriava, mas estendia-se a todos os descendentes deste par, reunidos todos na mesma casa matriarcal ou patriarcal, dependendo da cultura que foi sendo construída em cada sociedade.
            Esses laços diferenciados exigiam, como compromisso dos indivíduos que constituíam esses pequenos núcleos, reciprocidade em todos os aspetos da vida, lealdade, protecionismo, cuidado, defesa, deferência e como consequência do progresso moral inevitável, sentimentos mais elevados de cuidado, carinho, amor. Este último desenvolvendo-se, intensivamente, entre os sujeitos com papéis de mães e filhos, depois, também, entre pais e filhos, irmãos, o casal e assim por diante.
            No entanto, durante muito tempo assistimos essa instituição ser manipulada por indivíduos, com grande progresso intelectual, mas pouquíssimo desenvolvimento moral e espiritual, como moeda de troca, de barganha de cargos sociais ou títulos nobiliárquico por dinheiro ou riquezas torpes de todo tipo, desconsiderando, esses espíritos adoecidos e adormecidos das Leis Divinas, os sentimentos elevados já conquistados pelos homens com a contribuição dessa nobre e inspirada construção social.
            Nomeamos essa instituição de família, que antes de ser uma construção social, faz parte do plano de Deus para que as criaturas na Terra tenham um auxílio valioso em seu inevitável progresso moral.
            Na questão 775 d'O Livro dos Espíritos, Kardec – conhecendo a ignorância humana e percebendo que a família, na Terra, embora com enorme potencial edificador, passou e ainda passa por abalos que desestabilizam sua redentora missão – questiona aos benfeitores espirituais “qual seria, para a sociedade, o resultado do relaxamento dos laços de família”, ao que os espíritos respondem que seria “uma recrudescência do egoísmo”. De vital importância essa questão, pois considerando que o egoísmo é a chaga da nossa sociedade, conforme questão 913 do mesmo O Livro dos Espíritos, nossa ferida aberta enquanto grupo social, se o relaxamento dos laços de família intensificará o egoísmo na Terra isto significa, em contrapartida, que para desenvolvermos o  altruísmo, o amor, os sentimentos nobilitantes que nos conduzirão ao progresso moral anelado, temos que fortificar os laços de família na nossa sociedade.
            A resposta dos espíritos também esclarece que a instituição família é o bendito instrumento de Deus para que possamos vencer o causador de todas as desditas humanas que é o egoísmo que nutrimos e que nos afasta das bençãos Divinas ao nos alijar dos sentimentos de fraternidade, solidariedade, altruísmo e amor que somente a convivência com o próximo pode nos oferecer.
            Na família aprendemos a compartilhar com abnegação, porque nutrimos afeto por aqueles que compartilham nosso dia-a-dia, aprendemos a compreender o outro, porque conhecemos suas lutas passadas e presentes, sabemos seus sonhos de futuro, felicitamo-nos com suas conquistas e enternecemo-nos com seus incentivos para com nossas lutas. Na família aprendemos a repartir, dividir, mas também multiplicar sonhos, participar da felicidade alheia, fruir da companhia doce de quem amamos e com quem vamos intensificando esse sentimento Divino do Amor. É na família que vamos construir as bases do Amor Universal que nos lembra Jesus quando diz que um dia seremos um só rebanho e haverá um só Pastor.
            Mas a convivência em família não é algo que possamos adjetivar de fácil. Há muitos percalços, muitas dificuldades, muitos desentendimentos e muito a transformar em nós mesmos para conseguirmos manter relações saudáveis em família. Deparamo-nos, no lar, com parentes muito diferentes de nós. Se somos organizados, por vezes defrontamos um irmão desleixado que não organiza seu próprio espaço íntimo. Convivemos com uma mãe super-protetora, com um pai controlador. Mas o amor nos faz aprender a conviver bem com cada personalidade que comunga do nosso mesmo lar.
            Assim é que aprendemos a conviver, por exemplo, com um colega do escritório que é tão desorganizado quanto nosso irmão, ou com o chefe que é controlador a maneira de nosso pai e assim por diante. Enfim, todos os desafios da vida familiar são eminentemente educativos ao Espírito imortal, vocacionado ao progresso cuja a convivência na micro-sociedade que é a família contribui sobremaneira, em todas as funções que venha a ocupar o indivíduo, seja como pai, mãe, filho, tia, avô, etc. Todas essas funções na unidade familiar trazem consigo aprendizagens muito significativas ao nosso amadurecimento espiritual e nos cabe vivê-las com sabedoria, ou seja, aproveitando cada lição que tenhamos a oportunidade de vivenciar
            O Amor em Família engendra o Amor Universal. O Amor em Família vai aniquilando a carga egoística da nossa sociedade. O Amor em Família contribui, poderosamente, para o progresso individual e para o progresso de toda a humanidade. Assim é que necessitamos empenharmo-nos em defender a instituição familiar nos tempos que se apresentam ao nosso trabalho, pois que se ela configura-se construída socialmente, com certeza o plano inspirador pertence ao Pai Maior que pede nosso auxílio para protegê-la, santificá-la e concretizar seu objetivo superior: a instauração do Amor Universal entre os Homens.

Vida conjugal

            Lembra-nos o Benfeitor Espiritual Camilo[3] que todos trazemos necessidades educativas para esse mundo e carecemos, no campo das vivências afetivas, de uma complementação psíquica e emocional que nos impulsiona na busca do encontro de uma alma cuja afinidade espiritual favoreça essa permuta de energias e nos preencha essa lacuna psíquica. Não se trata do mito das “metades eternas” desmitificado por Allan Kardec sem equívoco e, nem tampouco, da tese romântica das almas gêmeas.
            Simplesmente, somos seres transcendentes portadores de uma porção de aprendizados indispensáveis ao nosso paulatino progresso espiritual. Na multidão de Espíritos reencarnados na Terra, são vários os que são portadores de uma configuração de aprendizados comuns que lhes são oportunos, bem como, com uma certa identidade no que se refere à trajetória espiritual e desenvolvimento moral e intelectual, nas suas mais diversas gradações e pelas leis da sintonia, nos encontramos nos caminhos terrestres e, a partir do sentimento de simpatia recíproca desperta-se à comunhão afetiva, ou ainda, pela afinidade dos próprios limites espirituais, vamos ver uniões nascerem entre seres que se fazem instrumento de progresso doloroso ou tropeço, um do outro, em simbioses psíquicas perturbadoras.
            Noutros casos, que não podemos ignorar, percebemos almas irmanadas nos propósitos de renovação e amor reencontrarem-se na Terra, tendo em vista a realização dos ideais enobrecidos no campo do amor, do casamento e da família, e esses casos não são tão raros como, de forma pessimista, muita gente imagina. Esses realizam muito bem o que recomenda o Espírito Bernard Palissy, conforme a anotação kardeciana em a Revista Espírita: “Uni-vos, pois, não apenas pelo amor, mas para o bem que podeis fazer a dois.”[4]
            Cabe ao casal, nesse caso, cumprir com dedicação o programa reencarnatório estabelecido na vida espírita, antes do renascimento, junto de seus Guias Espirituais, objetivando a concretização da tarefa delineada para a sua espiritualização e para o seu contributo, por menor que se faça, ao progresso da família humana.
            Tendo em vista orientar os cônjuges para o êxito da vida conjugal, ao analisar os ângulos espirituais da família, o Espírito Camilo declara que  “O essencial que os indivíduos que se lançam na formação de uma nova família, assumissem compromisso de com o conhecimento de si mesmos.” [5]
            O conhecimento de si mesmo que cada indivíduo deve cultivar, para que jamais transfira ao outro a responsabilidade de suas andanças e o respeito ao projeto de auto-realização do outro, a fim de que o casamento não se institua numa relação asfixiante da outra alma ou numa masmorra de desamor.
            O autoconhecimento é recurso sobejamente conhecido pelos espiritistas, entretanto, para que atenda o seu desiderato feliz é fundamental que o apliquemos cotidianamente, tal como recomenda Santo Agostinho em O Livro dos Espírito, fazendo um balanço problematizador de nosso cotidiano, verificando as aprendizagens conquistadas e as experiências equivocadas que merecem correção de rumo, em função de querermos jornadear conscientemente num rumo crescente para Deus.
            Quando não exercitamos o autoconhecimento, podemos deixar-nos subjugar pelo ego e seus mecanismos de fuga. Segundo Novaes[6] o ego é “a representação do Espírito no mundo externo. Ele é, de um lado, a síntese momentânea da personalidade integral, do outro, uma função que permite a ligação da consciência com os conteúdos conscientes.” Enfim, no delineamento da psique elaborado por Jung, o ego tem um lugar central no consciente, nada obstante, a sua incompletude ante o ser integral, ocupa-se da questão da manutenção da identidade do indivíduo, de sua personalidade atual e de mediação entre o campo da consciência e inconsciente, devendo obedecer a regulação do eu profundo.
            Entre os mecanismos de fuga do ego, o eminente psiquiatra Alírio de Cerqueira Filho, destaca o de projeção. Nesse caso, é comum que o indivíduo ainda não identificado mais profundamente consigo mesmo passe a querer responsabilizar os outros em relação aos seus insucessos e frustrações. Nesse caso, diz-nos que “A única forma de se libertar da projeção é interromper esse mecanismo de transferência, aceitando os seus defeitos e responsabilizando-se pelos seus erros e acertos e, com isso, tornar-se uma pessoa melhor.”[7]
            Vejamos que para a saúde espiritual da relação conjugal, tanto quanto, para a dos cônjuges, como individualidades extracorpóreas conectados ao corpo físico pelos mecanismos da reencarnação e vocacionados à plenitude, é indispensável o exercício continuado do autoconhecimento para que, superando-se os ditames do ego infantil, a autorealização promova o bem-estar e o autoamor que deságua no amor ao outro, com serenidade e contentamento, na convivência conjugal.
            O casamento se fundamenta no amor dos seres que se unem que, para ser amor, não pode ser edificado na anulação da identidade do outro e nem na perseguição egotista de uma felicidade aparente, calcada fruição de conquistas individualistas sem consideração para com a partilha da existência com o outro. Precisamos encontrar convergência nos projetos pessoais e parceria na edificação positiva do lar cujos pilares são os Espíritos que o formam ligados pelo mais genuíno amor.
           

O amor no lar, novamente

            A relação conjugal estabelecida no autoconhecimento gera o respeito profundo ao outro que se estende, quando chegarem, aos filhos. É na exemplificação do entendimento dos próprios limites que alguém consegue desenvolver a indulgência com as alheias imperfeições e no autoperdão que aprendemos a arte de perdoar nossos seres queridos.
            De forma equilibrada, quem ama a si mesmo, que não é a mesma coisa que egolatria, aprende a amar o outro e o seu livre-arbítrio, sem aquele ímpeto de domínio da vontade alheia, comum a Espíritos de mentalidade estreita e apóia, sem medo, os projetos edificantes elegidos pela alma com a qual está a partilhar essa vida.
            Na lealdade, probidade e consciência plena das responsabilidades sedimenta-se o amor familiar que irá acolher seus hóspedes, os filhos de Deus que temporariamente recebe por rebentos seus cuja missão é fazê-los exitosos sobre si mesmos, ante as suas programáticas espirituais. Adentrando o lar o amor ilumina a todos, instituindo um clima de respeito profundo, boa vontade e presença positiva nas lutas comuns.
            O amor em casa, tal como o preconizado por Jesus de Nazaré, é o que dá rumo seguro à família como educandário sublime cujo altruísmo é a lição fundamental. O amor é o caminho do êxito da instituição familiar, jamais ultrapassada, constituindo-se, inclusive, na terapêutica mais excelente para a solução de intrincados conflitos, oriundos da incompreensão de hoje ou dos desenganos morais perpetrados no passado e condicionante de nossas ações na atualidade, pedindo a educação pessoal para o bem de todos os partícipes do campo doméstico.

Para pensar:

            “A união e a afeição que existem entre pessoas parentes são um índice da simpatia anterior que as aproximou. Daí vem que, falando-se de alguém cujo caráter, gostos e pendores nenhuma semelhança apresentam com os dos seus parentes mais próximos, se costuma dizer que ela não é da família. Dizendo-se isso, enuncia-se uma verdade mais profunda do que se supõe. Deus permite que, nas famílias, ocorram essas encarnações de Espíritos antipáticos ou estranhos, com o duplo objetivo de servir de prova para uns e, para outros, de meio de progresso.”[8]



[1] Historiadora, Doutora em Educação. E-mail: camachocarvalho@yahoo.com.br.
[2] Professor, Doutor em Educação. E-mail: vlousada@gmail.com.
[3] TEIXEIRA, J. Raul. Desafios da Vida Familiar. Pelo Espírito Camilo. 2.ed. Niterói, RJ: Fráter Livros Espíritas, 2003, p. 46.
[4] KARDEC, Allan. Revista Espírita: jornal de estudos psicológicos. Ano Primeiro – 1858. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 2004, p. 513.
[5] TEIXEIRA, J. Raul. Nos passos da vida terrestre. Pelo Espírito Camilo. Niterói, RJ: Fráter Livros Espíritas, 2005, p.
[6] NOVAES, Adenauer. Psicologia do Espírito. 2. Ed. Salvador: Fundação Lar Harmonia, 2003, p. 99.
[7] CERQUEIRA FILHO, Alírio de. Saúde espiritual. Santo André, SP: Editora Bezerra de Menezes, 2005, p. 75-76.
[8] KARDEC, Allan. O evangelho segundo o espiritismo. 120. Ed. Rio de Janeiro, RJ: FEB, 2002, p. 108.

domingo, 5 de maio de 2013

ALLAN KARDEC EM PARIS: guia de viagem - Glauco Adams

Livro Allan Kardec em Paris

Depois de muitas pesquisas, incluindo viagens a Paris, foi publicado meu livro ALLAN KARDEC EM PARIS.
É um guia de viagem para o turista que vai a Paris e tem interesse em Kardec. Mas destina-se, também, a quem NÃO irá a Paris: o livro pode ser uma viagem virtual junto comigo.
Embarque em uma viagem pelos pontos relacionados com Allan Kardec em Paris, em um guia repleto de fotos.
Viva a emoção de seguir os passos de Allan Kardec na capital francesa. Veja por onde ele andou, por onde ele olhou, onde ele morou. Conheça os locais relacionados com o Espiritismo. Saiba um pouco da história e como chegar a cada um deles.
O livro está disponível em edição iBooks, compatível com iPad; em edição Kindle; e em edição PDF. A edição iBooks é mais moderna, com visual mais atrativo, e traz alguns vídeos.