segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Atravessando Decepções


Vinícius Lousada



“(...) A infelicidade é a alegria, é o prazer, é o tumulto, é a vã agitação, é a satisfação louca da vaidade, que fazem calar a consciência, (...).” – Delphine de Girardin[1] [1]



Todo mundo que se encontra reencarnado na Terra, de uma forma ou de outra, já se viu às voltas com as decepções ocasionadas por experiências que não deram certo. Os malogros nas expectativas geram em nosso íntimo um sentimento de frustração capaz de nos levar às lágrimas ou até mesmo, se formos descuidados, a um quadro de desequilíbrio emocional.

A reação diante das desilusões varia de acordo com o nível de consciência, de quem as experimenta, com relação à dinâmica da vida. Existem pessoas que, em suas análises descabidas, se revoltam e põem-se a culpar terceiros de seus insucessos; alguns também dizem ser por causa dos Espíritos desencarnados o mau resultado de seus empreendimentos. Muitos se revoltam, abandonam as crenças que “deveriam” – no seu mesquinho entendimento – facilitar-lhes o acesso às coisas boas da Terra.

Ainda há aqueles que se crêem perseguidos pelo azar ou que pensam terem nascido para sofrer – lançam mão da idéia distorcida do “carma” –, deixando-se conduzir por pensamentos de masoquismo e lamentação onde, muito provavelmente, desencarnados infelizes se satisfazem associando-se ao campo mental de suas invigilantes vítimas. 

Outros, porém, quando atravessam qualquer surpresa desagradável, embora sofram, chorem porque são gente e sintam uma tristeza decorrente do fatoinfeliz, que num primeiro momento parece significar o naufrágio de seus sonhos, aproveitam o saber espírita que já internalizaram para entender o porquê de suas aflições presentes. Estes estabelecem mediante a prece um alargar dos horizontes sobre sua reencarnação atual, e se candidatam a concretizar um belo roteiro de fé, renúncia e coragem, rumo às alternativas para atingirem o tentame que tanto anelam.

Eles agem “(...) como bravos soldados que, longe de fugirem ao perigo, preferem as lutas dos combates arriscados à paz que não lhes pode dar glória, nem promoção!(...)[1][2] Aliás, uma certa canção do Sul já apontou: “Não tá morto quem peleia!”

Dessa forma, quem se dispõe a seguir em frente, buscando captar – à luz do Espiritismo – a lição que a dificuldade lhe traz, passa a desenvolver um comportamento otimista diante das ocorrências ruins, identificando as pedrasdo caminho como material para erguer uma estrada rumo ao seu ideal, porque compreende racionalmente que tudo conspira ao seu favor e se algo não aconteceu como o esperado, não obstante toda a sua dedicação e esforço, foi porque a Divina Providência não julgava fundamental para a sua evolução, como nos elucida o Espírito Joanes, através da psicografia de Raul Teixeira: “(...) coisa nenhuma é essencialmente importante para o seu progresso espiritual a não ser a sua sempre crescente integração no espírito da vida, (...).”[1][3] 

Assim, dentro de uma resignação ativa, façamos o possível para depreender o que se passa conosco, senão especificamente, ao menos em linhas gerais e quando nosso sonho seja nobre e útil no “reino do espírito”, tenhamos perseverança, pois tudo correrá bem. 

Nada de depressão! Nem tampouco de desespero ou inconformismo doentio. Ensina-nos Allan Kardec, ao comentar as causas das misérias humanas que “(...) A situação material e moral da Humanidade terrestre nada tem que se espante, desde que se leve em conta a destinação da Terra e a natureza dos que a habitam.”[1][4] Deste modo, podemos considerar a nossa Casa Planetária como uma escola onde precisamos galgar passo-a-passo seu currículo para, no tempo devido, avançarmos nos níveis de estudo e obtermos condições para realizar as tarefas exigidas pelo aprendizado adquirido. 

Espíritos calcetas que somos, apresentamo- nos na Terra como alunos rebeldes em estado de repetência de experiências com vistas a um futuro promissor. 

Essa é a possibilidade de um amanhã mais prazenteiro, que se inicia no presente momento no qual nos dispomos a aprender, crescer e conquistar uma vitória diferente da que o mundo materialista, promotor de um consumismo fanatizante propõe: uma vitória sobre nós mesmos, no tocante à libertação de nossos condicionamentos inferiores.

Para tanto, é preciso muita coragem porque nesses dias de disputas descabidas, de agressividade exacerbada nas mais diversas formas de sua danosa apresentação, compondo o horrendo espetáculo de nossa insistente animalidade, enfrentar a si mesmo, num esforço hercúleo de nos tornarmos criaturas melhores, promotoras da felicidade e do amor onde estivermos é um desafio descomunal, mas necessário aos que abraçamos o Espiritismo.

Então querido irmão ou irmã, não nos agastemos com qualquer forma de desânimo, recordemo-nos que o Pai sabe de tudo quanto precisamos para sermos felizes, jamais nos desamparando, concedendo-nos até mesmo um “(...) Espírito protetor de uma ordem elevada(...)[1][5] para nos inspirar ânimo e alegria em cada etapa de nossa jornada evolutiva, sendo este um ser amorável que não deixa de apostar em nossas potencialidades, fazendo-se conselheiro fiel e irmão constante no consolo de nossas aflições. 

Caso estejamos enfrentando graves provações, sejam elas de afastamento dos seres queridos por motivos alheios à nossa vontade, enfermidades difíceis, uma perda qualquer, ou até mesmo a infelicidade de ver nossos sonhos projetados ao longo do tempo não se efetivarem, guardemos confiança naProvidência Divina, que nos reserva sempre o que há de bom e verdadeiramente imprescindível.

Lembremo-nos sempre do Mestre de nossos corações quando ditou às almas sofridas pelas intempéries da existência corporal: “Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta.(.. .)”[1][6] E destarte, fiquemos alegres! 

[1] O Evangelho segundo o Espiritismo, Cap. V, item 24.
[2] Idem.
[3] TEIXEIRA, J. Raul. Para uso diário. Pelo Espírito Joanes. 3.ed.Niterói, RJ: Fráter, 2001; p. 43.
[4] O Evangelho segundo o Espiritismo, Cap III, item 6.
[5] O Livro dos Espíritos, questão 491.
[6] Mateus 6: 26.

Fonte: Revista Internacional de Espiritismo – Maio/2005