(Camille Flammarion: cientista espírta)
Vinícius Lousada - educador
Em seus estudos sobre as relações possíveis entre a Nova Ciência e o campo da espiritualidade, Dalai Lama (1), autoridade máxima do budismo em sua corrente tibetana, destaca o papel espiritual e profundamente humanista que deveria ser assumido pela Ciência no mundo em que estamos de passagem.
Nesse sentido, a Ciência como um campo de conquistas tecnológicas e intelectuais deveria se deixar orientar pelo exercício indiscriminado da compaixão, ou seja, se permitir conduzir pelo desejo acendrado de aliviar o sofrimento onde ele esteja instalado.
Para tanto, seria preciso que a Ciência, falo aqui das ciências ordinárias em suas diversas ramificações, fosse afetada pela temática espiritualidade e se visse provocada a abrir mão do reducionismo materialista, cujo paradigma bem se encaixa aos interesses egoístas que hegemonicamente ainda comandam o desenvolvimento científico.
A crise ecológica se coloca à Ciência como forte questão que problematiza a ética que a tem orientado, aliás, a ética que tem sido assumida pelos homens e mulheres, no mundo, que pautam suas existências numa perspectiva materialista e imediatista que advoga pelo desejo, pela posse, pelo egoísmo, enfim.
Essa crise também denuncia o destino infausto que estamos produzindo para a nossa espécie – estabelecendo na dinâmica de ação e reação, que rege o cosmos, duros resgates coletivos –, pelo modo nada sábio que temos agido para conosco, com os demais seres vivos e para com a Mãe-Terra.
Como é fácil perceber não é a Ciência que é má. Os adjetivos niilista, reducionista e materialista não se aplicam somente ao campo do saber científico, pois, apesar de tanta oferta religiosa na sociedade, faltam-nos valores de espiritualidade que reorientem o nosso modo de ser e estar na realidade planetária, afinal, ainda nos deixamos conduzir por um paradigma empobrecido do ser humano.
Segundo Allan Kardec, o Espiritismo tem um importante papel a realizar, fazendo-se ponte entre a Ciência e o campo espiritual, sobretudo por ser uma ciência ética que estuda um objeto ignorado pelas outras ciências, cujos métodos de investigação estabelecidos em bases materialistas são incapazes de sondar.
Escreve o pensador orientado pelo Espírito de Verdade que:
“O Espiritismo não descobriu, nem inventou este princípio [da união do princípio espiritual para animar e organizar a matéria]; mas foi o primeiro a demonstrar-lhe, por provas inconcussas, a existência; estudou-o, analisou-o e tornou-lhe evidente a ação. Ao elemento material, juntou ele o elemento espiritual. Elemento material e elemento espiritual, esses os dois princípios, as duas forças vivas da Natureza. Pela união indissolúvel deles, facilmente se explica uma multidão de fatos até então inexplicáveis”. (2)
Verifiquemos que o Espiritismo encara sob o ponto de vista científico uma questão até então centralizada pelas conjecturas metafísicas e que as religiões tentaram tomar somente para si: o elemento espiritual.
Com Kardec, entendamos o elemento espiritual como um dos princípios constitutivos do universo, assim como a matéria e Deus, a Causa Primeira. Mas vale lembrar que “Individualizado, o elemento espiritual constitui os seres chamados Espíritos, como, individualizado, o elemento material constitui os diferentes corpos da Natureza, orgânicos e inorgânicos”. (3)
Voltando à crítica do Dalai Lama à ciência oficial, conforme podemos inferir de seus escritos, a Ciência precisa descobrir a consciência, a causa dos fenômenos subjetivos ou espirituais e, a partir desse ponto, reconfigurar seu direcionamento ético para o altruísmo.
Nessa linha de análise precisaríamos de uma ciência da consciência, ou seja, uma ciência que nos ensine a perceber a realidade espiritual e a prestarmos atenção em nossa verdadeira natureza.
Essa é a proposta mesmo da Ciência Espírita ao descortinar, baseada em evidências científicas acerca dos fenômenos mediúnicos recolhidas na metodologia kardequiana, a realidade do Espírito imortal.
Entretanto, a utilidade desse saber está na razão direta de sua aplicação por parte daqueles que dele tomam conhecimento. Logo, quando se fala numa ciência da consciência é oportuno não esquecermos que a consciência não-localizada no corpo físico é o próprio Espírito (somos nós), a individualidade incorpórea dotada de inteligência, pensamento e vontade.
Desse modo, é preciso que nos apropriemos de tal forma do saber exarado nas obras fundamentais da Doutrina dos Espíritos que, por consequência, nos façamos senhores de nós mesmos, ou seja, emancipados intelectualmente da cegueira espiritual do materialismo, tanto quanto das superstições.
Estudando Kardec:
"Demonstrando a ação do elemento espiritual sobre o mundo material, alarga o domínio da ciência e, por isto mesmo, abre uma nova via ao progresso material. Então terá o homem uma base sólida para o estabelecimento da ordem moral na Terra; compreenderá melhor a solidariedade que existe entre os seres deste mundo, desde que esta se perpetue indefinidamente; a fraternidade deixa de ser palavra vã; ela mata o egoísmo, em vez de ser morta por ele e, muito naturalmente, imbuído destas ideias, o homem a elas conformará as suas leis e suas instituições sociais.” (4)
(Texto publicado em: http://www.oconsolador.com.br/ano3/132/vinicius_lousada.html e na Revista Internacional de Espiritismo de novembro de 2009)
Referências:
(1) LAMA, Dalai. O universo em um átomo: o encontro da ciência com a espiritualidade. Rio de Janeiro: Ediouro, 2006.
(2) A Gênese segundo o Espiritismo, cap. I, item 18.
(3) A Gênese segundo o Espiritismo, Cap. XI, item, 6.
(4) Revista Espírita, novembro de 1864 – O Espiritismo é uma ciência positiva.