quinta-feira, 12 de novembro de 2009

A Cultura Espírita no Rio Grande do Sul através do jornal "A Evolução"



JOSÉ ROBERTO DE LIMA DIAS


(Trabalho apresentado no 5.º ENLIHPE - Fonte: http://www.espiritualidades.com.br/Liga/5_ENLIHPE_2009/trabalhos/14_jose_roberto.htm)

RESUMO

O presente trabalho, ao destacar a importância da imprensa espírita, em Rio Grande no final do século XIX, pretende discutir algumas questões fundamentais para a cultura espírita na fase pioneira dessa imprensa, através do jornal A Evolução, primeiro instrumento de divulgação e formação de uma consciência da filosofia espírita no Rio Grande do Sul. Portanto, apoia-se na análise da construção do discurso visando compreender o projeto cultural da Doutrina Espírita, especialmente, concentrando-se na investigação dos processos de significação humanos, através dessa imprensa, nos períodos de circulação da folha que ocorreu entre 1892 e 1893. Nessa trajetória, busca-se o processo e sua linguagem, os autores, o público alvo e a inserção cultural do Espiritismo, através dessa folha, na comunidade rio-grandina.


A CULTURA ESPÍRITA NO RIO GRANDE DO SUL ATRAVÉS DO JORNAL “A EVOLUÇÃO”


No Rio Grande do Sul, o Espiritismo teria chegado, segundo a tradição oral (1),por volta de 1868, com dois marinheiros espanhóis que primeiramente se estabeleceram em São José do Norte, eram eles “médiuns” e promoviam fenômenos de efeitos físicos. As pessoas que lhes procuravam obtinham resultados satisfatórios para seus problemas, quer de saúde quer de orientação para os desequilíbrios psíquicos. Ao chamar a atenção e atrair grande número de pessoas, curiosos ou desorientados que procuravam amparo, foram perseguidos pelo clero e então se transferiram para Rio Grande e mais tarde para a cidade de Pelotas.

No que tange à estruturação da imprensa espírita no Rio Grande do Sul, decorre num primeiro momento do surgimento de grupos de estudos familiares, que gradativamente passam a se institucionalizar dando origem aos “Centros Espíritas”, com a finalidade do estudo sério e metódico das chamadas “obras básicas” que formam o “Pentateuco Kardequiano”. Os primeiros periódicos que surgiram, configuram um padrão narrativo cujo discurso espírita emergia de princípios ético-morais, conforme paradigma estabelecido por Allan Kardec na introdução do primeiro número da “Revista Espírita” (Janeiro de 1858):

“Nossa Revista será, assim, uma Tribuna, na qual, entretanto, a discussão jamais deverá afastar-se das normas das mais estritas conveniências. Em uma palavra, discutiremos, mas não disputaremos.” (2)

Seguindo a orientação de Kardec, conforme sua afirmação na referida “Revista Espírita”, que a publicação deste primeiro periódico visava preencher uma lacuna, e que a “utilidade de um órgão especial é manter o público a par desta nova ciência bem como preveni-los dos “exageros da credulidade” (3), os espíritas rio-grandenses trataram logo de criar seus jornais, para veicular as idéias da “Codificação”, bem como registrar todos os fatos que ocorressem nas chamadas reuniões mediúnicas.

Prática esta, característica da cosmologia espírita, que dá lugar ao intercâmbio com o mundo metafísico, resultando em um circuito reconstrutivo da codificação escrita, assim, interagindo com as “obras básicas” no sentido de complementação. Resultando em uma “[...] literatura bastante variada, incluindo textos de divulgação, romances mediúnicos, dissertações, textos doutrinários, mensagens psicografadas, etc. [...]” (4). Assim, as práticas de escrita e leitura sempre desfrutaram de um importante lugar no interior dos centros espíritas.

Absorvidos pelo ideal espírita, os pioneiros da doutrina em Rio Grande buscaram na imprensa uma forma eficiente de divulgação e propaganda dos postulados por eles defendidos. Nesse sentido, lançam em 1º de fevereiro de 1892, a primeira edição do jornal A Evolução. Fundado por Domingos Toscano Barbosa, da Sociedade Espírita Rio- Grandense, sendo a primeira manifestação oficial da imprensa espírita, no Rio Grande do Sul, circulava quinzenalmente e tinha escritório próprio na rua 16 de julho nº 15. Até a edição nº 6, apresentava dimensões e formato 0,39 x 0,29, com 4 páginas e 3 colunas. Apresentava-se como collaboração livre ao custo de 1$000, por assinatura de três meses, com “pagamento adeantado”. Tinha como lema: “Se as palavras preparam o caminho, as obras o completam.” e “O mais bello de todos os templos é um coração puro”.


Notas:

(1) Confirmada por muitos militantes antigos do movimento espírita em Rio Grande, entre eles, Domingos Caruso que, por mais de 50 anos esteve à frente do movimento. Entretanto, o espiritismo institucionalizado ocorre com a fundação da Sociedade Spírita Rio-Grandense, em Rio Grande, conforme registro em ata do dia 29-05-1887. Ainda no final do século XIX, surge a Sociedade Espírita Allan Kardec, fundada em 1898 e a Sociedade Espírita Bezerra de Menezes, fundada em 26-02-1901. Em 12-03-1903, promove-se a fusão das três casas, originando-se a atual Sociedade Espírita Kardecista, localizada à rua General Neto nº 398.

(2) Kardec, Allan. Revista Espírita – jornal de estudos psicológicos. Tradução de Salvador Gentile. São Paulo: Instituto de Difusão Espírita, 1993.p.3.

(3) Idem, p.2.

(4) LEWGOY, Bernardo. A Antropologia Pós-Moderna e a Produção Literária Espírita. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre: UFRGS, n.9, p. 87-113, jun.199



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



ALVES, Francisco das Neves. A pequena imprensa rio-grandina no século XIX. Rio Grande: Ed. FURG, 1999.

DE MARIO, Marcus Alberto. Espiritismo & Cultura: elementos de história, teologia e antropologia. Rio de Janeiro: Mauad, 2002.

KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. Tradução de Guillon Ribeiro. 59 ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1992.

_______. Revista Espírita – jornal de estudos psicológicos. Tradução de Salvador Gentile. São Paulo: Instituto de Difusão Espírita, 1993.

LEWGOY, Bernardo. A Antropologia Pós-Moderna e a Produção Literária Espírita. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre: UFRGS, n.9, p. 87-113, jun.1998.

MONTEIRO, Eduardo Carvalho. 100 anos de comunicação espírita em São Paulo (1881- 1981). São Paulo: Madras, 2003.

PINHEIRO, Ney da Silva. Síntese do Processo Histórico do Espiritismo no Rio Grande do Sul. A Reencarnação, Porto Alegre, n.419, p. 26-39, 2o . sem. 1999.

RAMOS, Clóvis. A imprensa espírita no Brasil: 1869-1978. Juiz de Fora: Instituto Maria, 1979.

* os trabalhos completos estarão disponíveis em forma de livro *

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