quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

O QUE ENSINA O ESPIRITISMO



"O Espiritismo tende para a regeneração da humanidade: isto é um fato adquirido. Ora, não podendo essa regeneração operar-se senão pelo progresso moral, daí resulta que seu obje­tivo essencial, providencial: é o melhoramento de cada um; os mistérios que nos pode revelar são o acessório, porque nos abre o santuário de todos os conhecimentos, não estaríamos mais adiantados para o nosso estado futuro, se não formos melhores. Para admitir ao banquete da suprema felicidade, Deus não per­gunta o que se sabe, nem o que se possui, mas o que se vale e o bem que se terá feito. É, pois, no seu melhoramento individual que todo Espírita sincero deve trabalhar, antes de tudo, Só aquele que dominou suas más inclinações aproveitou realmente o Espiritismo e receberá a sua recompensa. É por isto que os bons Espíritos, por ordem de Deus, multiplicam suas instruções e as repetem à sociedade; só um orgulho insen­sato pode dizer: Não preciso de mais. Só Deus sabe quando aquelas serão inúteis e só a ele cabe dirigir o ensino de seus mensageiros e de o proporcionar ao nosso adiantamento.

Vejamos, entretanto, se fora do ensinamento puramente mo­ral, os resultados do Espiritismo são tão estéreis quanto pre­tendem alguns.

1.º — Inicialmente ele dá, como sabem todos, a prova pa­tente da existência e da imortalidade da alma. É verdade que não é uma descoberta, mas é por falta de provas sobre este ponto que há tantos incrédulos ou indiferentes quanto ao futuro; é provando o que não passava de teoria que ele triunfa sobre o materialismo e evita as funestas conseqüências deste sobre a sociedade. Tendo mudado em certeza a dúvida sobre o futuro, é toda uma revolução nas idéias, cujas conseqüências são incalculáveis. Se ai, se limitassem os resultados das ma­nifestações, esses resultados seriam imensos.

2.º — Pela firme crença que desenvolve, exerce uma ação poderosa sobre o moral do homem; leva-o ao bem, consola-o nas aflições, dá-lhe força e coragem nas provações da vida e o desvia do pensamento do suicídio.

3.º — Retifica todas as idéias falsas que se tivessem sobre o futuro da alma, sobre o céu, o inferno, as penas e as recom­pensas; destrói radicalmente, pela irresistível lógica dos fatos, os dogmas das penas eternas e dos demônios; numa palavra, descobre-nos a vida futura e no-la mostra racional e conforme à justiça de Deus. E ainda uma coisa de muito valor.

4.º — Dá a conhecer o que se passa no momento da morte; este fenômeno, até hoje insondável, não mais tem mistérios; as menores particularidades dessa passagem tão temida são hoje conhecidas; ora, como todo o mundo morre, tal conhecimento interessa a todo o mundo.

5.º — Pela lei da pluralidade das existências, abre um novo campo à filosofia; o homem sabe de onde vem, para onde vai; com que objetivo está na terra. Explica a causa de todas as misérias humanas, de todas as desigualdades sociais; dá as mes­mas leis da natureza para base dos princípios de solidariedade universal, de fraternidade, de igualdade e de liberdade, que só se assentavam na teoria. Enfim, lança a luz sobre as questões mais árduas da metafísica, da psicologia e da moral.

6.º — Pela teoria dos fluidos perispiritais, dá a conhecer o mecanismo das sensações e das percepções da alma; explica os fenômenos da dupla vista, da visão à distância, do sonambulismo, do êxtase, dos sonhos, das visões, das aparições, etc.; abre um novo campo à fisiologia e à patologia.

7.º — Provando as relações existentes entre os mundos cor­poral e espiritual, mostra neste último uma das forças ativas da natureza, um poder inteligente e dá a razão de uma porção de efeitos atribuídos a causas sobrenaturais, e que alimentaram a maioria das idéias supersticiosas.

8.º — Revelando o fato das obsessões, faz conhecer a causa, até aqui desconhecida, de numerosas afeções, sobre as quais a ciência se havia equivocado, em detrimento dos doentes, e dá os meios de os curar.

9.º — Dando-nos a conhecer as verdadeiras condições da prece e seu modo de ação; revelando-nos a influência recíproca dos Espíritos encarnados e desencarnados, ensina-nos o poder do homem sobre os Espíritos imperfeitos para os moralizar e os arrancar aos sofrimentos inerentes à sua inferioridade.

10.º — Dando a conhecer a magnetização espiritual, que era desconhecida, abre ao magnetismo uma nova via e lhe trás um novo e poderoso elemento de cura.

O mérito de uma invenção não está na descoberta de um princípio, quase sempre anteriormente conhecido, mas na apli­cação desse princípio. A reencarnação não é uma idéia nova, sem a menor contradita, como não é o perispírito, descrito por São Paulo sob o nome de corpo espiritual, nem mesmo a co­municação com os Espíritos. O Espiritismo, que não se gaba de haver descoberto a natureza, procura cuidadosamente todos os traços, que pode encontrar, da anterioridade de suas idéias, e, quando os encontra, apressa-se em o proclamar, como prova em apoio ao que avança. Aqueles, pois, que invocam essa ante­rioridade visando depredar o que ele faz, vão contra o seu obje­tivo, e agem incorretamente, pois isto poderia fazer suspeitar uma idéia preconcebida.

A descoberta da reencarnação e do perispírito não pertence, pois, ao Espiritismo. E coisa sabida. Mas, até ele, que pro­veito a ciência, a moral, a religião haviam tirado desses dois princípios, ignorados pelas massas, em estado de letra morta? Ele não só os pôs à luz, os provou e faz reconhecer como leis da natureza, mas os desenvolveu e faz frutificar; deles já fez saírem numerosos e fecundos resultados, sem os quais não se poderia compreender uma infinidade de coisas; diariamente com­preendemos outras novas e estamos longe de esgotar a mina. Desde que esses dois princípios eram conhecidos, porque ficaram tanto tempo improdutivos? Porque, durante tantos séculos, todas as filosofias se chocaram contra tantos problemas insolúveis? É que eram diamantes brutos, que deviam ser lapidados: é o que faz o Espiritismo. file abriu uma nova via à filosofia ou, por outras palavras, criou uma nova filosofia que, diariamente, ocupa seu lugar no mundo. Então estes são resultados de tal modo nulos que devamos apressar-nos para descobertas mais verdadeiras e mais sólidas?
Em resumo, um certo número de verdades fundamentais, esboçadas por alguns cérebros de escol, e conservadas, em sua maioria, como que em estado latente, uma vez que foram estu­dadas, elaboradas e provadas, de estéreis que eram, tornam-se uma mina fecunda, de onde saíram inúmeros princípios secun­dários e aplicações, e abriram um vasto campo à exploração, novos horizontes às ciências, à filosofia, à moral, à religião e à economia social."


Allan Kardec


(texto extraído da Revista Espírita, agosto de 1865 - O que ensina o Espiritismo.)